Por toda Minas Gerais, maestros de bandas de música ajudam a manter importante tradição da cultura brasileira
Além de formar instrumentistas as corporações reúnem várias gerações
Elas podem até não estar na crista da onda. Os instrumentos nem são de primeira linha. Mas é fato: quem resiste a dar uma paradinha diante da legítima banda de música? Importante tradição cultural brasileira – mesmo em tempos de eletrônica, samplers, tchus, tchas e afins –, as euterpes resistem como podem, principalmente no interior do Brasil.
“Uma cidade sem banda não vale nada. É a mesma coisa de capela sem santo”, compara o sorridente José Miguel do Carmo. Aos 89 anos, experiência não lhe falta para garantir isso. Há quase meio século ele integra a Banda de Música Santa Cecília de Barão de Cocais, na Região Central do estado, uma das 701 corporações registradas em Minas Gerais. Toda semana é a mesma coisa. Quinta e sexta-feira são dias sagrados de ensaio. Nos fins de semana, o grupo atende compromissos na região.
Seu José Miguel fica alegre, mesmo, quando está na última fileira. No comando da pomposa tuba, ele faz a marcação para os colegas. Detalhe: trata os meninos como se fossem netos. “Sou o vovô da banda, tenho muita ligação com eles”, comenta.
É tradição: o próprio maestro ensina o pessoal a tocar todos os instrumentos. Para ingressar na banda, não se exige conhecimento musical – basta querer. Se a criança demonstra interesse, é só procurar a banda. Em São Brás do Suaçuí, a formação começa a partir dos 6 anos, com aulas de iniciação musical. Quando a garotada chega aos 12, é considerada preparada para seguir os veteranos. A União Musical Santa Cecília tem 22 instrumentistas. Mas 14 jovens já estão aptos para integrá-la.
Em Turmalina, no Vale do Jequitinhonha, a Corporação Musical Euterpe Homero Maciel tem em Valdir Alves dos Santos o maestro e o professor. “Observo se o menino tem queda para um instrumento ou outro. É preciso muita psicologia para isso”, conta ele, que já comandou bandas em Itamarandiba, no Vale do Jequitinhonha, e em Coluna, no Vale do Rio Doce.
Atualmente, por enfrentar dificuldades financeiras, a Corporação Homero Maciel conta com um dos menores grupos de sua história, iniciada em 1919. São 28 músicos. “Já tive 50. Era a época de que mais gostava. Estamos sem estrutura, sem instrumentos”, revela Valdir Alves. Como a banda é mantida pelo município, ele espera o apoio prometido pelo novo prefeito.
RENOVAÇÃO PREOCUPA
Ninguém paga para entrar. Mas é preciso dedicação à banda, além de comparecer religiosamente aos ensaios semanais. Uma das dificuldades enfrentadas pelos maestros é justamente a manutenção do grupo. “Os meninos entram com 6 anos, começam a aprender teoria, com 8 sabem tocar e ficam até os 18, quando fazem vestibular e vão morar fora da cidade ou passam a trabalhar. Quando o músico está bom, deixa o grupo. Por isso é importante mantermos a dinâmica de renovação”, defende o maestro Tiago Souza, de São Brás do Suaçuí.
Regente da Banda 12 de Março, o veterano Francisco Guimarães formou várias gerações de músicos em Belo Horizonte. “Começo com os meninos aos 10 anos. Hoje, está aí essa marmanjada”, brinca. Fundada por ele em 1975 e sediada na região do Bairro Vale do Jatobá, a 12 de Março é considerada banda-escola. “Todo mundo entra aqui para se formar. Tenho de apresentar todos os tipos de música para eles conhecerem”, explica o maestro.
No repertório da Corporação Euterpe Homero Maciel, por exemplo, entram canções gospel e até sertanejo. “O que for popular a gente toca”, conclui o maestro Valdir Alves.
Saiba mais
A protetora
Santa Cecília, padroeira dos músicos, dá nome a várias corporações. Em Minas, as cidades de Maravilhas, Carmópolis, Pará de Minas, Araújos, Abre Campo e Mariana têm bandas que homenageiam a santa. No repertório erudito, Händel e Benjamin Britten compuseram peças em honra a ela.